Dependência química: recursos terapêuticos no tratamento

Artigo do psiquiatra Pablo Miguel Roig,CRM 24968, Presidente do Conselho Editorial do Instituto Greenwood , Diretor Clínico e fundador da Clínica Greenwood

Ao tratarmos adicções, devemos considerar que estamos
enfrentando uma patologia que apresenta características
diferentes da grande maioria de doenças que são os alvos dos
profissionais da saúde. Devemos vencer resistências por parte
dos pacientes, das suas famílias, com uma legislação confusa, de
ideologias baseadas num liberalismo ingÊnuo, o
desconhecimento e a falta de formação dos que devem lidar com
o problema.
Trata-se de uma doença que, diferente das outras,
envolve as suas vítimas num elo de negação, fazendo com que os
profissionais que trabalham contra sua patologia tenham que
convencê-los de que adoeceram e que perderam o controle de
suas vidas há muito tempo, que o trabalho terapêutico é difícil,
longo e necessitado de um vínculo entre eles e as equipes que os
tratam, que as mudança devem ser importantes, tanto para os
pacientes como para seu entorno e que a abstinência de todos
os elementos bio-psico-neuro-socio-genetico-tóxicos deve ser
imprescindível, assim como suas relações com gente da ativa. Os
pacientes que procuram a nosso serviço, que muitas vezes é
através de sua família, devem enfrentar uma missão quase
impossível, desde seu ponto de vista e para agravar a situação,
pelo fato de vierem sempre depois de muitos anos de uso,
apresentam-se com alterações valorativas, impulsividade
intensa, elementos defensivos precários e alterações cerebrais
que priorizam o presenteísmo e a satisfação imediata
inconsequente antes da análise de consequências a curto, médio
e longo prazo.
O tempo de tratamento, tendo em conta a
dificuldade de enfrentar estas mudanças, é o necessário,
contrariando as expectativas nossos pacientes e geralmente
tendem a interromper o tratamento em forma precoce, tão logo
passam a se sentir melhor. Isto facilita que recaiam num tempo relativamente curto, fracassando em sua tentativa e
passando por muitas experiencias de reinternação.Não
esqueçamos que todo contato com drogas é uma experiência
ilegal, auto-agressiva e em alguns casos fatal.

Para enfrentar esta doença, principalmente em casos de certa
gravidade, a internação é a condição que permite a manutenção
da abstinência e o limite concreto tão fortemente evitado pela
estrutura imediatista dos pacientes que não podem esperar,
vivendo uma vida no presente e sem capacidade de medir a
consequência de seus atos, tendo como recursos defensivos a
negação e a projeção. Esta estrutura egóica ineficiente os leva a
procurar a saída química como forma de enfrentar qualquer
situação emocional que proporcionem os estímulos do dia a dia.
O tratamento procura treiná-los para uma vida melhor, com um
projeto enriquecedor e vital, no lugar do projeto tanático com
que chegam à consulta.A internação involuntária permite que
tenhamos tempo para chegarmos aos objetivos terapêuticos que
se enfrentam com as crenças, valores e prioridades que
acompanham aos dependentes químicos
. Não é casual que o
NIDA, organismo dos Estados Unidos que se dedica ao estudo
das adicções, em sua avaliação das características que deveriam
ter os tratamentos para serem eficientes, descreve a
complexidade das medidas terapêuticas e frisa a necessidade de
levar o tratamento até o fim, independentemente do tempo que
isto exija, deixando claro que a desintoxicação é o começo do
processo e não o processo em si e não descarta a
involuntariedade como parte do programa de tratamento.