Maconha:as mentiras sobre esta droga devastadora, causa de delírios, agressividade e surtos

Artigo do psiquiatra Juan Pablo Roig Albuquerque,CRM 126345, e da psicóloga Joyce Kelly Sommer, CRP 06/74957

Dr. Juan Pablo Roig Albuquerque-médico-CRM 126345- pós graduado em psiquiatria pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.e integrante do Conselho Editorial do Instituto Greenwood

Joyce Kelly Sommer- Psicóloga-CRP 06/74957 -Especialista em Dependências Químicas e pós-graduada em psicopatologia pela USP. 

Vamos falar sobre maconha de uma forma cientifica, política, ideológica ou leviana?

Esse texto foi escrito por dois profissionais da área da saúde, ou seja, ele foi escrito embasado em dados científicos, estudos e sobretudo na experiência de dezenas de atendimentos diários ao longo de anos de trabalho na área da dependência química. 

Não há nenhum problema em discutir o tema, o problema está em discutir com pessoas sem seriedade, imprudentes e sem nenhuma qualificação ou experiência na área. O pior é discutir com uma rede de pessoas com interesses financeiros e políticos colocando tantas vidas e famílias à beira de uma vida carregada de prejuízos com consequências devastadoras tanto na área social, como na psicológica e biológica. Podendo em muitos casos levar à morte. 

Uma das drogas mais controversas e discutidas atualmente é a maconha, com várias “fake News” a seu respeito, como por exemplo: 

“É uma erva natural e não prejudica tanto como outras drogas”.

Diante desse pensamento, trazemos a informação de que qualquer droga é nociva e devastadora. Geralmente tem-se a ideia de que cocaína e crack são drogas muito prejudiciais, porém há uma falsa difusão da ideia de que a maconha é uma droga leve. Os profissionais que estão na linha de frente, que atendem os pacientes e seus familiares, conseguem com propriedade acompanhar as consequências terríveis que a maconha pode trazer, pois além da droga de escolha, é importante saber que cada uma tem a sua atuação e prejuízos específicos. 

-“É uma substância que abre a mente e deixa a pessoa mais criativa, melhor que remédio”. 

A verdade é que a maconha causa prejuízos importantes à memória, raciocínio e à capacidade de resolver problemas.

“Maconha acalma, relaxa e baixa a ansiedade”. 

Atualmente, nota-se que os níveis de THC da maconha estão cada vez mais elevados e ao mesmo tempo observamos um aumento de crises graves de pânico e ansiedade em pacientes usuários desta droga.

Geralmente, dependentes químicos têm preconceito relacionado ao uso de medicamentos. Um bom exemplo que ilustra a afirmação supracitada é que tais pacientes quando se propõem a parar de usar drogas ilícitas, muitas vezes apresentam algumas comorbidades e têm resistência ao uso de medicamentos para tratá-las. Cabe ressaltar que tais medicamentos foram testados por no mínimo 8 anos antes de serem completamente aprovados para prescrição testando se há efeitos colaterais que impeçam sua liberação no mercado. Dizem que remédio faz mal mostrando a total incoerência e falta de crítica, pois estão destruindo seu organismo e sua mente com substâncias extremamente venenosas com aditivos desconhecidos utilizados para aumentar a quantidade e melhorar o lucro do traficante, não questionam a origem de tais substâncias, sabem que terão uma série de efeitos colaterais, mas utilizam as utilizam mesmo assim. Há uma inversão de valores dos usuários transformando medicamentos seguros, testados e aprovados em vilões e as drogas sem segurança alguma com inúmeros efeitos colaterais e potencial enorme para trazer prejuízos a si e a terceiros são enaltecidas e muitas vezes endeusadas. 

Indo nessa linha fica um pouco mais fácil explicar a incoerência total em defender a maconha. Imaginemos que seja desenvolvido um “medicamento” que cause aumento de risos, alteração sensitiva com percepção de cores mais brilhantes, aumento do apetite e sensação de apatia ou euforia. Que ajude um pouco em dores crônicas e com efeito antiemético. Na bula desse remédio teríamos os seguintes efeitos colaterais:

Alterações da pressão sanguínea, alterações da frequência cardíaca, piora de patologias respiratórias como asma, alterações no controle de movimentos, pode causar desorientação, sensações de paranoia, aumento da ansiedade, crises de pânico,  alterações cognitivas com deterioração da memória e, se utilizada em adolescentes, diminuição de QI de forma irreversível. Quadros de delírios e alucinações, aumento das possibilidades de desenvolver esquizofrenia, alteração do senso temporal, alterações de humor, dificuldade para resolver problemas, desmotivação, tosse crônica, aumento do risco de obter infecções pulmonares, aumento do risco de infarto, aumento da concentração de esperma, porém com diminuição da qualidade do sêmen. Quando utilizado durante a gravidez pode causar baixo peso neonatal, problemas do desenvolvimento neurológico do feto com maior risco de alterações de memória, atenção e para resolução de problemas na criança. Passagem da substância pelo leite materno, Síndrome da Hiperemese Canabinoide o que pode levar a desidratação severa por vômitos e náuseas repetidos e graves. Depressão, ansiedade, pensamentos suicidas, problemas relacionais. Pode causar dependência. Agora lendo todos esses efeitos colaterais ficaria impossível defender esse “remédio”.

Pois bem, esse “medicamento” é nada mais nada menos que a Maconha. E esses, seus efeitos colaterais. Estamos aqui falando da maconha utilizada na forma de cigarro, já que usada com vaporizadores, extratos ou como alimento tem além dos mencionados, alguns outros efeitos colaterais. Há relatos de morte súbita em usuários de maconha em vaporizadores e de mortes por hemorragias em pacientes nos EUA, que utilizaram maconha sintética. Portanto, chegamos à conclusão de que não existem motivos para liberar tal substância.

“Liberar a maconha acabaria com a violência e tráfico”.

Se pensarmos em criminalidade, existe mercado negro de cigarro e de álcool. O fato de serem drogas lícitas não acabou com o tráfico desses produtos. Em vista disso, nós recomendamos o documentário Murder Mountain, que mostra o aumento da violência no condado de Hamboldt nos EUA, após a liberação da maconha nessa localidade. 

Já que o álcool e cigarro são liberados, por que não liberar a maconha? Essas duas substâncias já causam um grande estrago no sistema de saúde a nível mundial, afetando também a segurança pública dos países e a educação gerando prejuízos enormes. Em realidade, há um grande consumo dessas drogas lícitas com consequências devastadoras. Imagine ainda liberar mais substâncias nocivas à saúde para serem consumidas.  

Com tudo o que foi exposto até aqui, fica difícil defender a liberação de uma substância com tais características, correto? Pois bem, a resposta mais óbvia seria sim, no entanto, opor-se à liberação da maconha é remar contra uma grande corrente criada por parte da mídia, políticos, traficantes, empresários visando apenas lucro. Hoje, escutamos pais falarem, ” Mas é normal fumar, todos os amigos dele fumam”. Por favor, o fato de várias pessoas fazerem algo, não significa que isso seja normal. Normal é seu filho(a) estudar, brincar, namorar, viajar, se relacionar com outros, fazer planos e não ficar dependente de uma droga que causa sérios problemas, restringindo cada vez mais sua vida ao uso de drogas. Isso não é normal! 

Além disso, existe a medicina baseada em evidências e por atuarmos na área da dependência química há mais de 15 anos, iremos apresentar um caso, o qual chamamos de medicina baseada na experiência, para que entendam um pouco com o que lidamos ao perder essa guerra contra as drogas. Infelizmente, este é apenas um dos muitos casos que atendemos anualmente em nossa clínica. É importante ressaltar que, tudo começou com um uso de maconha visto como ” normal”.

UM CASO REAL DAS CONSEQUÊNCIAS DO USO DE MACONHA

Respeitamos os critérios éticos e por isso o sigilo do paciente será mantido, usaremos um nome fictício e pequenas alterações que permitam manter o anonimato deste. 

A.R , internado aos 18 anos, ensino médio incompleto, natural de Alagoas,  usou apenas maconha desde os 13 anos. 

Segundo seus pais, A.R não apresentou nenhum problema de saúde na infância, teve uma boa adaptação na escola, era afetivo e um aluno mediano. A partir dos 7 anos, teve alguns comportamentos mais agressivos na escola e na família. Aos 13 anos iniciou o uso de maconha, foi flagrado pelos pais, que na época, entenderam como algo passageiro ou ” normal da adolescência”. A.R, continuou o uso diário da maconha, mudando ainda mais seu comportamento, ficando mais agressivo, com humor irritado e queda significativa nos estudos.  Aos 14 anos ele foi expulso da escola por ser encontrado com maconha e por ter feito uso no local. Aos 15 anos aumenta a frequência do consumo, passando a usar maconha várias vezes ao dia. Ele ficava sozinho na casa dos pais, teve um afastamento total dos amigos e apenas se relacionava com pessoas usuárias de maconha. Era um menino que gostava de esporte e nesse ano parou com tudo. A agressividade ficou ainda mais intensa. Passava o dia na rede social fazendo manifestações e apologia à liberação e uso da maconha. Ainda aos 15 anos, apresentou um quadro psicótico. Falava sozinho, apresentava embotamento afetivo, delírios de grandeza e persecutórios, falava que era um Deus Grego, agente do FBI, personagens da TV  e, em outros momentos, que estava sendo perseguido e denunciado. Agredia qualquer pessoa na rua ou na sua casa, quando acreditava estar sendo perseguido, denunciado, etc. Teve algumas passagens pela polícia geradas por tais comportamentos. Teve episódios de alucinações visuais e auditivas presenciados por familiares. Conversava frequentemente com pessoas imaginárias e também dizia receber ordens através do armário, rádio, televisão, etc. 

Nessa época teve sua primeira internação em clínica psiquiátrica de sua cidade. Ficou 2 meses internado, recaindo 10 dias após sair da clínica.

Aos 16 anos o quadro permanece e o uso de maconha também. Nessa época, faz uma viagem com a sua família para Portugal e novamente apresenta um surto psicótico, pois interrompeu a medicação e usou maconha.  Foi internado fora do Brasil por 1 mês.

Retorna ao Brasil e é novamente internado em clínica de sua cidade. Após alta aos 18 anos de idade, recai no uso de maconha e é novamente internado com quadro de delírios e alucinações acreditando ter poderes de leitura da mente e apavorado com a ideia de que leiam sua mente também. Apresentava medos extremos a diferentes situações devido a suas alucinações. Ao longo de seus tratamentos e recaídas em diversas clínicas, foi apresentado quadro de refratariedade a medicamentos, ou seja, dificuldade de obter uma resposta positiva eliminando os sintomas de delírios e alucinações, sendo necessário polifarmacologia com doses altas para controlar tais sintomas que nunca regrediram completamente. Encontra-se em tratamento com acompanhamento de equipe multidisciplinar e com sua capacidade de exercer sua autonomia muito reduzida. Infelizmente, assim como este paciente, temos muitos outros com as mesmas características. Início de sintomas psicóticos (delírios e alucinações) após uso de maconha em grande quantidade na adolescência, resposta muito pobre aos medicamentos antipsicóticos, alterações significativas nos testes neuropsicológicos.

Trazemos nossa experiência acreditando que informação é uma arma potente para a prevenção contra as drogas, mostrar que uma droga tão subestimada pelo seu potencial destruidor como a maconha tem que ser melhor estudada, tem que ser mais entendida e levando em conta todos os prejuízos que pode causar principalmente a nossos jovens que ainda se encontram em processo de maturação cerebral.